De testemunha a réu: a estratégia processual que mudou o destino de um caso criminal famoso
No decorrer da instrução processual, essa testemunha se transformou em acusada.
Por Ricardo Henrique Araújo Pinheiro
Direto de Brasília
Uma questão muito interessante envolve a transformação de uma testemunha em acusado num processo criminal. Recentemente, acompanhamos na imprensa mundial o caso de um jogador de futebol famoso que foi acusado e condenado pelo crime de estupro. Inicialmente, uma das pessoas condenadas foi arrolada na denúncia apenas como testemunha. No decorrer da instrução processual, essa testemunha se transformou em acusada. Como é possível uma testemunha se tornar um acusado e, eventualmente, sofrer os efeitos de uma condenação criminal?
Quando o Ministério Público oferece uma acusação criminal, ele precisa ter indícios de autoria e materialidade delitivas. Esses requisitos objetivos estão estabelecidos no artigo 41 do Código de Processo Penal, que exige que a denúncia ou queixa contenha a exposição do fato criminoso com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos para identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas.
Para oferecer uma denúncia, o Ministério Público não precisa de provas exaustivas de autoria e materialidade delitivas, pois até esse momento não há contraditório, ou seja, a parte acusada não pode se defender. O momento processual da instrução é quando o acusado pode exercer o direito ao contraditório e à ampla defesa, podendo contradizer o que o Ministério Público incluiu na denúncia e produzir provas em seu favor.
É importante destacar que a obrigação de comprovar o que está sendo alegado é do Ministério Público. No oferecimento da denúncia, vigora o princípio pro societate, ou seja, na dúvida, denuncia-se. Já na prolação da sentença, aplica-se o princípio in dubio pro reo, ou seja, na dúvida, absolve-se o réu.
Voltando ao nosso assunto, como uma pessoa inicialmente arrolada como testemunha pode virar acusada e ser condenada? Em primeiro lugar, a testemunha não pode mentir, diferentemente do réu, que pode mentir ou ficar calado como estratégia de defesa. A testemunha é obrigada a falar a verdade, sob pena de cometer o crime de falso testemunho.
Muitas vezes, por estratégia da acusação, pessoas são arroladas como testemunhas, apesar de existirem indícios suficientes para incluí-las como acusadas. O Ministério Público pode adotar essa estratégia para garantir que a testemunha não minta nem omita fatos relevantes. No decorrer da instrução processual, após colher o depoimento da testemunha, o Ministério Público pode requerer o aditamento da acusação criminal, incluindo a testemunha como acusada, caso seu relato caracterize participação na infração criminal.
Essa estratégia permite ao Ministério Público obter informações preciosas da testemunha, que ele não conseguiria se a pessoa tivesse sido arrolada inicialmente como acusada. No caso mencionado, parece que o Ministério Público da Itália adotou essa estratégia: incluiu um terceiro como testemunha na denúncia originária e, após colher seu depoimento, aditou a denúncia para incluí-lo como acusado, resultando em uma condenação criminal.
Em resumo, a transformação de uma testemunha em acusado pode ocorrer por estratégia processual do Ministério Público, que inicialmente arrola a pessoa como testemunha para garantir a veracidade de seu depoimento e, posteriormente, adita a denúncia para incluí-la como acusada com base nas informações obtidas durante a instrução processual.
Até a próxima!
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