Cerveja ou símbolo de status? A verdade amarga por trás da Heineken no Brasil
Heineken chega a R$ 20 no Piauí e custa R$ 8,90 no Maranhão. Impostos e marketing explicam disparidade nos preços da cerveja
Heineken, no Piauí, virou símbolo.
Mais do que sabor, ela entrega status. É a cerveja do festival, do camarote, da balada. Do “close certo” no Instagram.
A marca consegue vender um status primordial mas o custo com os impostos fica alto no bolso do piauiense.
E isso tem um preço que o brasileiro paga com gosto, mesmo quando o bolso reclama.
A demanda não cai, mesmo quando a garrafa bate o dobro do valor que custa em outros países. A explicação? Marketing bem feito e vaidade bem explorada.
O retrato de um absurdo cotidiano
Você entra num restaurante em Teresina, pede uma Heineken long neck, e ela chega gelada. Preço? R$ 13,90. Se optar por uma de 600 ml, o valor pode ultrapassar R$ 20,00.
Os preços variam. Atravessar a ponte e chegar em Timon-MA ja mostra outra realidade.
Agora atravessa a Ponte Metálica. Em Timon, cidade vizinha no Maranhão, depósitos de bairro vendem a mesma Heineken 600 ml por R$ 8,90, muitas vezes entregue na porta de casa, no gelo.
O que muda entre uma margem e outra do rio? Quase nada — além da política tributária, da lógica de distribuição e da forma como o consumo é encarado. A diferença de preço escancara mais do que economia: revela um sistema que cobra caro até pelo que deveria ser simples.
A margem de lucro que sobra é pequena, e se a gente não cobrar mais caro, o imposto engole. O cliente até reclama, mas não vê que quase metade do valor vai pro governo.
Relatou um proprietário de bar em Teresina.
No Piauí, o imposto pesa ainda mais
O ICMS sobre bebidas alcoólicas no Piauí chega a 27%, um dos mais altos do país. Isso sem contar o IPI, PIS e Cofins — que, somados, fazem com que a carga total supere os 50% do valor final da cerveja.
Além disso, a logística de distribuição no estado encarece ainda mais o produto, especialmente em cidades do interior onde o frete é repassado direto para o consumidor.
O problema não é só a carga tributária, mas a forma como ela é distribuída. O consumidor paga mais do que deveria, especialmente em produtos que fazem parte do cotidiano. É um sistema que penaliza a base da pirâmide.
Avaliou, sob reserva, um especialista em consumo ouvido por esta coluna.
Heineken no Brasil x no mundo
País/Estado | Preço médio Heineken 600ml |
Piauí (bares) | R$ 17,90 |
Maranhão (depósitos) | R$ 8,90 |
São Paulo (supermercado) | R$ 9,50 |
Bahia (praias) | R$ 18,00 |
Rio de Janeiro (turismo) | R$ 22,00 |
Alemanha | R$ 4,30 (long neck) |
Argentina | R$ 2,30 (long neck) |
O preço da Heineken no mundo
A Heineken é uma das cervejas mais consumidas globalmente, mas seu preço varia muito conforme o país — influenciado por impostos, poder de compra, produção e distribuição.
Tendências globais:
- Mais caros: Emirados Árabes e Qatar têm preços altíssimos por conta das leis severas sobre álcool. Nova York também está no topo.
- Moderados: Na Europa, uma long neck de 330ml varia de US$ 1 a US$ 2 em supermercados.
- América do Norte e Central: EUA, Canadá e México giram em torno de US$ 2,50 por 330ml.
- Mais baratos: Gana chegou a vender por US$ 0,83, Caracas (Venezuela) por US$ 0,70. Parte da Ásia e da África segue com preços bem abaixo da média global.
E o Brasil nessa história?
O Brasil é um mercado estratégico para a Heineken. A marca é vista como premium, mesmo sendo produzida localmente. Segundo relatórios internacionais, o real desvalorizado impacta a receita em euro da empresa, mas o preço em reais segue firme — ou seja, o brasileiro paga mais em moeda local, mesmo quando a receita líquida global cai.
Além disso, o crescimento no volume de vendas, especialmente no segmento sem álcool, fortalece o posicionamento da marca no país. E isso mantém a estratégia de preço elevado: quem quer status, paga.
A lei da demanda? De folga.
Mesmo custando mais do que no país onde nasceu, a Heineken segue firme no topo de vendas.Ela se transformou em um bem simbólico de consumo aspiracional.
Não se bebe apenas pela sede — mas para ser visto com ela na mão.
O Ponto de Ruptura
No Brasil — e no Piauí em particular — não se paga apenas por uma cerveja. Paga-se pela ineficiência do sistema, por um estado que taxa alto e por uma cultura que transforma o banal em fetiche de consumo.
A pergunta que fica: até quando vamos tratar garrafa como troféu e imposto como parte do brinde?
Enquanto isso, Timon-MA continua entregando gelada na porta — e com troco.
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