Coluna Penal 360

Saiba como o sequestro judicial de bens combate o crime e promove a Justiça no Brasil

Sequestro de bens é aplicado especificamente aos produtos ou proveitos decorrentes de infrações penais.

30 de junho de 2024 às 15:32
16 min de leitura

Por Ricardo Henrique Araújo Pinheiro

Direto de Brasília

No cenário jurídico brasileiro, a prática do sequestro judicial de bens se estabelece como uma estratégia crucial na luta contra a criminalidade, respaldada por dispositivos legais robustos como o Código de Processo Penal (CPP) e o Decreto-Lei nº 3.240, de 8 de maio de 1941. Essa medida cautelar tem como objetivo primordial assegurar o ressarcimento de danos oriundos de atividades ilícitas, desempenhando um papel vital na proteção da ordem econômica e na promoção da eficiência administrativa da justiça.

Ricardo Henrique Araújo Pinheiro - Foto: Divulgação

Conforme delineado no artigo 125 do CPP, o sequestro de bens é aplicado especificamente aos produtos ou proveitos decorrentes de infrações penais, introduzindo uma diferenciação essencial entre os bens adquiridos por meios ilícitos e aqueles obtidos legalmente pelo acusado. Essa distinção é de suma importância para preservar o patrimônio legítimo do acusado, direcionando o foco do sequestro para bens imóveis provenientes de atividades criminosas, incluindo aqueles que possam ter sido transferidos a terceiros.

Além disso, o Decreto-Lei nº 3.240/41 expande significativamente o alcance do sequestro para abarcar situações que impactam diretamente a Fazenda Nacional. Esse dispositivo legal permite a constrição de todos os bens do indiciado, abrangendo também aqueles sob a posse de terceiros, desde que adquiridos de maneira dolosa ou com culpa grave. Tal medida é explicitada no artigo 4º do decreto, que estipula:

Art. 4º O sequestro pode recair sobre todos os bens do indiciado, e compreender os bens em poder de terceiros desde que estes os tenham adquirido dolosamente, ou com culpa grave.

Prisão - Foto: Oxana Melis na Unsplash

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem reiteradamente reforçado a aplicabilidade e a importância dessa medida cautelar. Em decisões notáveis, como no Recurso Especial (REsp) nº 149.516/SC, sob a relatoria do Ministro Gilson Dipp, destacou-se a superioridade do artigo 1º do Decreto-Lei nº 4.240/41 sobre o artigo 125 do CPP, evidenciando um mecanismo acautelatório específico voltado ao ressarcimento da Fazenda Pública em casos de delitos cometidos contra ela.

Em outra decisão relevante, o Recurso em Mandado de Segurança (RMS) nº 29.854/RJ, relatado pelo Ministro Nefi Cordeiro, concluiu-se que o sequestro pode ser aplicado a qualquer bem dos requerentes, independentemente de serem diretamente produtos ou proveitos do crime. Essa decisão sublinha a flexibilidade da medida, permitindo que ela englobe bens não diretamente ligados à conduta criminosa, potencializando assim sua efetividade.

O julgamento do Recurso em Mandado de Segurança (RMS) nº 49.904/RJ, realizado pela Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em 27 de setembro de 2016, e publicado no Diário da Justiça Eletrônico (DJe) em 5 de outubro do mesmo ano, trouxe à tona um caso emblemático que ilustra a complexidade e a importância do sequestro judicial de bens em investigações de fraude contra a Previdência Social no Brasil. O relator do caso, Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, destacou em seu voto as suspeitas bem fundamentadas levantadas pelo Ministério Público sobre a origem ilícita dos bens apreendidos, marcando um ponto crucial na luta contra a corrupção e a lavagem de dinheiro.

As suspeitas do Ministério Público derivaram de uma análise detalhada do período de aquisição dos bens, que ocorreu entre 2009 e 2011. Essa janela temporal coincidiu com a atuação de uma quadrilha especializada em fraudes contra a Previdência, da qual o filho do recorrente era membro. A investigação revelou uma discrepância significativa entre a renda declarada do recorrente e de sua esposa e o valor dos automóveis apreendidos, levantando questionamentos sobre a legalidade da aquisição desses bens.

Este caso ressalta a importância do sequestro judicial de bens como uma ferramenta eficaz no combate à criminalidade financeira. Ao permitir o sequestro de bens adquiridos ilicitamente, o sistema jurídico brasileiro assegura que os ativos obtidos por meio de atividades criminosas possam ser identificados e retidos, impedindo que os infratores se beneficiem de seus crimes. Além disso, essa medida cautelar serve como um mecanismo de dissuasão, enviando uma mensagem clara de que o sistema de justiça está vigilante e capaz de rastrear e neutralizar os proventos da criminalidade.

O RMS nº 49.904/RJ também destaca a necessidade de uma investigação minuciosa e baseada em evidências para fundamentar o sequestro de bens. O trabalho do Ministério Público, neste caso, exemplifica o rigor e a diligência necessários para estabelecer a conexão entre os bens apreendidos e as atividades ilícitas subjacentes. A capacidade de estabelecer essa ligação é essencial para garantir que o sequestro judicial de bens seja utilizado de maneira justa e efetiva, respeitando os direitos dos acusados enquanto protege o interesse público.

Em suma, o julgamento do RMS nº 49.904/RJ pelo STJ serve como um marco significativo na jurisprudência brasileira, reforçando o papel do sequestro judicial de bens como uma estratégia vital na prevenção e no combate à fraude e à lavagem de dinheiro. Este caso não apenas demonstra a eficácia dessa medida cautelar, mas também enfatiza a importância da colaboração entre as instituições de justiça e os órgãos de investigação para assegurar a integridade do sistema financeiro e a justiça social.

Trechos da ementa:

Tem razão, ainda, o parecer ministerial, quando observa que o sequestro de bens como medida assecuratória do processo penal não constitui pena, assim sendo, não há como se relacionar tal medida com uma possível imposição de pena a terceiro que não é parte no processo, não havendo que ser falar, por consequência, em violação ao princípio da pessoalidade da pena (art. 5º, XLV, da CF).

No julgamento do Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial (AgRg no AREsp) nº 736.813/SP, realizado pela Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em 1º de setembro de 2015, sob a relatoria do Ministro Sebastião Reis Júnior, uma questão fundamental foi posta à prova: os critérios para a apreensão e subsequente restituição de bens no contexto do Código de Processo Penal (CPP). Este caso, cuja decisão foi publicada no Diário da Justiça Eletrônico (DJe) em 22 de setembro de 2015, ilustra a complexa interação entre a necessidade de combater o crime e a proteção dos direitos individuais no sistema jurídico brasileiro.

De acordo com o artigo 126 do CPP, a apreensão de bens é uma medida que pode ser tomada com base na existência de "indícios veementes" da origem ilícita desses bens. Esta disposição legal visa impedir que frutos de atividades criminosas sejam utilizados ou dissipados antes que a justiça possa agir de forma efetiva. No entanto, o mesmo código estabelece que, para a restituição desses bens ao acusado, é necessário que não haja dúvida quanto à sua origem e licitude. Este é um princípio fundamental que busca equilibrar a eficácia da investigação criminal com a garantia dos direitos dos indivíduos.

O caso em questão trouxe à tona a discussão sobre o ônus da prova e a necessidade de uma avaliação criteriosa por parte das autoridades judiciais ao decidirem sobre a restituição de bens apreendidos. A decisão do STJ reiterou a importância de uma abordagem judiciosa, na qual a restituição de bens apreendidos deve ser considerada com cautela, especialmente em casos onde a origem dos bens permanece obscura ou questionável.

A deliberação do STJ neste caso enfatiza a responsabilidade do acusado em demonstrar a licitude dos bens para que sua restituição seja autorizada antes do trânsito em julgado da ação penal. Essa exigência reflete a preocupação do sistema jurídico em não apenas punir os culpados, mas também em assegurar que os bens adquiridos por meio de atividades criminosas não sejam facilmente reintegrados ao patrimônio do acusado sem uma comprovação clara de sua origem lícita.

Este julgamento destaca o equilíbrio delicado que o sistema de justiça deve manter entre a eficácia na luta contra o crime e a proteção dos direitos fundamentais dos indivíduos. Ao exigir que a restituição de bens apreendidos dependa da inexistência de dúvida sobre sua origem e licitude, o STJ reforça a ideia de que a integridade do processo penal e a justiça para as vítimas de crimes não devem ser comprometidas pela precipitação na devolução de bens potencialmente vinculados a atividades ilícitas.

Em suma, o julgamento do AgRg no AREsp nº 736.813/SP serve como um lembrete crucial da complexidade das questões legais envolvidas na apreensão e restituição de bens no âmbito do processo penal. Ele sublinha a necessidade de uma análise cuidadosa e fundamentada para garantir que a justiça seja feita de maneira equilibrada e justa, respeitando tanto a necessidade de combater o crime quanto os direitos dos acusados.

Trechos da ementa:

Se a apreensão dos bens, nos termos do art. 126 do Código de Processo Penal, depende apenas da existência de indícios veementes da proveniência ilícita dos bens, enquanto a restituição depende da inexistência de dúvida, resulta claro que a incerteza acerca da origem e licitude dos bens apreendidos deve ser dirimida pelo acusado, caso deseje a restituição antes do trânsito em julgado da ação penal, sendo seu o ônus da prova.

No Brasil, o sequestro judicial de bens se consolida como uma medida cautelar de suma importância, fundamentada pelo Código de Processo Penal (CPP) e pelo Decreto-Lei nº 3.240/41. Essa prática jurídica não se limita apenas a garantir o ressarcimento de prejuízos oriundos de atividades criminosas; ela se estende para proteger a ordem econômica e assegurar a eficácia da administração da justiça. A distinção clara entre bens adquiridos de forma ilícita e lícita é crucial, pois foca o sequestro em bens obtidos através de infrações penais, preservando o patrimônio legítimo dos acusados.

Decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reforçam a aplicabilidade e a flexibilidade dessa medida, ampliando sua eficácia na luta contra o crime e na proteção dos direitos das vítimas. O sequestro judicial de bens emerge, assim, como uma ferramenta crucial contra o crime e pela justiça, equilibrando a necessidade de justiça com a proteção dos direitos individuais.

A prática do sequestro judicial de bens, portanto, representa um pilar fundamental na estrutura de combate à criminalidade no Brasil, demonstrando a capacidade do sistema jurídico de adaptar-se e responder de maneira efetiva às complexidades do crime moderno. Ao mesmo tempo, ela reflete o compromisso do país com a preservação dos direitos fundamentais, garantindo que a justiça seja feita de maneira equilibrada e justa.

O sequestro judicial de bens, portanto, não é apenas uma medida de ressarcimento ou uma ferramenta de combate ao crime; é também uma expressão do compromisso do Brasil com a justiça e a ordem social. Ele simboliza o equilíbrio delicado entre a eficácia na luta contra o crime e a proteção dos direitos fundamentais dos indivíduos, reforçando a ideia de que a justiça deve ser feita, mas não à custa dos princípios que fundamentam a sociedade democrática.

Em conclusão, o sequestro judicial de bens no Brasil é uma demonstração de como o sistema jurídico pode ser tanto uma espada na luta contra o crime quanto um escudo na proteção dos direitos dos cidadãos. Ele é um componente vital na estratégia nacional de combate à criminalidade, assegurando que os criminosos não se beneficiem de seus atos ilícitos, ao mesmo tempo em que protege a integridade e o patrimônio dos inocentes. Descobrir como essa prática é implementada e evolui no Brasil é essencial para compreender os esforços do país na promoção da justiça e na manutenção da ordem social.

#SequestroJudicial #CombateAoCrime #JustiçaBrasil #ricaraujopinheiro

Fontes:

  • Decreto-Lei nº. 2848, de 7 de dezembro de 1940.
  • Decreto-Lei nº. 3698, de 3 de outubro de 1941.
  • Decreto-Lei nº. 3240, de 8 de maio de 1941.
  • REsp n. 149.516/SC, relator Ministro Gilson Dipp, Quinta Turma, julgado em 21/5/2002, DJ de 17/6/2002, p. 287.
  • RMS n. 29.854/RJ, relator Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 1/10/2015, DJe de 26/10/2015.
  • RMS n. 49.904/RJ, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 27/9/2016, DJe de 5/10/2016.
  • AgRg no AREsp n. 736.813/SP, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 1/9/2015, DJe de 22/9/2015.
Siga nas redes sociais

Veja também

Dê sua opinião

Canal LupaTV

Veja todas