Cresce o luxo, morre o socorro: Zona Leste de Teresina vive sem saúde pública

Região mais valorizada de Teresina concentra luxo, consumo e arrecadação, mas não oferece nenhum posto público de saúde para quem mais precisa

A Zona Leste de Teresina se transformou no novo centro de gravidade da capital: condomínios verticais, bares sofisticados, clínicas privadas e circulação intensa de pessoas. Mas há uma ausência tão evidente quanto incômoda: nenhuma unidade pública de saúde funciona 24h em toda a região.

Zona Leste de Teresina. O maior crescimento econômico e vertical da capital. Mas o crescimento para por aí.

Não existe UPA, nem UBS com horário estendido. Quem adoece na Zona Leste à noite está entregue à própria sorte — ou ao sistema privado.


Um acidente recente e uma constatação dolorosa

Esses dias, presenciei um acidente com um motociclista na Zona Leste de Teresina, próximo da meia noite. Coisa simples, mas suficiente para abalar: uma moto tombada, o piloto desorientado, gente se aproximando para ajudar — e o pensamento imediato de todos foi o mesmo: "pra onde levar?" 

Prejuízo, susto e o principal: para onde levar o acidentado? Hospital da Primavera era a melhor opção já que o acidente não era grave mas necessitava de avaliação médica.

Foi essa cena que me levou ao Hospital da Primavera, prestando socorro ao motoqueiro. Não como jornalista. Mas como cidadão. 

Queria ver com os próprios olhos o que se oferece a alguém que chega em uma situação como essa. A resposta me atingiu antes mesmo de entrar: estrutura precária, iluminação deficiente, ambiente hostil.


Tudo ali comunica o oposto do que deveria ser um lugar de acolhimento. E a constatação é dura: não estamos falando de luxo. Estamos longe até do básico.

Um hospital deveria ser um abrigo nos momentos de fragilidade. Mas o que encontrei foi um retrato do abandono institucional.

E pensar que quem cai de moto na Zona Leste — ou em qualquer canto da cidade — pode ter só isso como opção.  Mais a frente na matéria falarei sobre isso.

O problema não é dos ricos. É de quem sustenta a cidade

A Zona Leste não é só vitrine. É também o ponto de chegada e permanência diária de milhares de trabalhadores: garçons, mototaxistas, vigilantes, entregadores, ambulantes, diaristas. Gente que move a cidade — e que não tem para onde correr se algo acontecer à noite.

Uma febre, uma crise de pressão, uma queda de moto. Nada disso tem amparo público ali.

Hospitais privados não substituem o Estado

A rede privada cresceu — e cobra por isso. Já a rede pública é quase invisível. A UPA do Satélite, além de distante para bairros como Horto, Ininga e Cidade Jardim, vive superlotada e tem histórico de interdições. Nenhuma UBS da região funciona à noite. E o Plano Plurianual 2024–2027 da Prefeitura sequer menciona a expansão da saúde pública na Zona Leste.

Hospital da Primavera: sinais de abandono em plena capital

Quem busca socorro na madrugada acaba no Hospital do Satélite ou no Hospital da Primavera, na Zona Norte. Mas o que encontra ali está longe de ser acolhimento. A unidade apresenta cadeiras rasgadas, portas com pintura descascada, iluminação precária, farmácia deteriorada e quase nenhuma sinalização adequada.

Aqui não há nenhuma discussão política. Quero apenas que reflitam. Essa é uma das situações das portas principais do hospital.

Parece um hospital de beira de estrada — não uma unidade pública no centro da capital. E ainda assim, é para lá que vão centenas de pessoas das zonas Norte e Leste todos os dias.

Os pequenos detalhes alertam para o sinal de abandono e falta de cuidado mínimo.


Hospitais e UBSs de referência em capitais brasileiras

Enquanto Teresina enfrenta desafios na saúde pública, outras capitais mostram que é possível entregar qualidade com boa gestão:


Esses exemplos mostram que o problema não é o tamanho da cidade — é a escolha política.

Portas fechadas, porteiras trancadas

O HU da UFPI, hospital estruturado da capital, opera com portas fechadas para emergências: só recebe pacientes referenciados. O HUT, por sua vez, concentra o que pode e o que não pode, sem fôlego. E a Zona Leste, onde a cidade pulsa à noite? Continua ignorada.

O que pode ser feito — e já funciona em outras cidades

Medidas imediatas e viáveis:

É o mínimo.

O Ponto de Ruptura

A Zona Leste virou o centro da cidade. Mas continua tratada como periferia quando o assunto é saúde pública. Quem movimenta a economia, paga impostos e trabalha à noite também adoece.

O garçom que sai de madrugada, o motoboy que se acidenta, a mãe que passa mal — todos seguem sem amparo, sem estrutura, sem direção.

Sem saúde, não há cidade que se sustente. E Teresina está fingindo que não vê.