Gostaria de refletir sobre a beleza e a importância do duplo grau de jurisdição, um pilar do nosso sistema democrático que garante a todo acusado o direito constitucional de ter sua sentença revisada por uma instância superior. Essa análise se torna particularmente relevante no caso do jogador Daniel Alves.
Inicialmente, Daniel Alves enfrentou uma acusação gravíssima de estupro, resultando em uma condenação superior a quatro anos. No entanto, após a revisão da sentença, ele foi absolvido devido à fragilidade das provas apresentadas pela acusação. A decisão ressalta um princípio fundamental do direito: na dúvida, o juiz deve sempre absolver. É preferível absolver um possível culpado do que condenar um inocente, especialmente quando o Ministério Público não consegue comprovar a materialidade do crime de forma inequívoca.
O caso Daniel Alves ilustra os perigos de uma condenação injusta. Ele foi, em um primeiro momento, publicamente execrado, sofrendo as consequências da tríplice responsabilidade penal: perda da reputação (tanto pública quanto familiar), privação da liberdade (com a prisão preventiva que durou meses) e prejuízo financeiro (devido à multa de mais de um milhão de euros e possíveis indenizações por danos morais).
A aplicação da tríplice responsabilidade penal se encaixa perfeitamente no caso de Daniel Alves, um indivíduo que, mesmo sendo inocente, foi submetido a um linchamento público. Felizmente, ao ter seu caso revisado sob a égide do duplo grau de jurisdição, o Tribunal espanhol, composto por três desembargadoras e um desembargador, o absolveu por unanimidade, reconhecendo a falta de confiabilidade e a fragilidade das provas apresentadas pela acusação.
Essa decisão unânime, que absolveu Daniel Alves de uma acusação de estupro (um dos crimes mais graves e repugnantes do nosso sistema penal), nos leva a uma profunda reflexão sobre a condução inicial do processo. A denúncia fragilizada, somada à espetacularização midiática, destruiu a reputação de Daniel Alves. Agora, pergunto: como fica a reputação de Daniel Alves? Será que o Estado irá compensá-lo pelos danos causados? A exposição midiática do caso trará algum benefício para ele?
É imperativo questionar se a pessoa que fez a acusação infundada contra Daniel Alves (e quem afirma isso é o próprio tribunal) responderá por denunciação caluniosa, por ter dado causa à instauração de um processo criminal contra um inocente. O caso Daniel Alves é um exemplo marcante de como a vida de uma pessoa pode ser destruída por acusações precipitadas e como o duplo grau de jurisdição é essencial para corrigir injustiças.
Quem irá ressarcir Daniel Alves pelos meses de prisão preventiva e pelos gastos com advogados e fianças? Este caso paradigmático demonstra a importância do duplo grau de jurisdição na análise da coerência das decisões judiciais. Que o caso Daniel Alves sirva de alerta para aqueles que duvidam da nossa justiça: ela pode tardar, mas não deve falhar.
Devemos refletir sobre o impacto devastador de acusações infundadas e do sensacionalismo midiático na vida de um indivíduo. Será que a acusação, mesmo diante da fragilidade das provas, tem o direito de acusar sem qualquer responsabilidade? Não seria o momento de repensarmos a forma como as denúncias são apresentadas? Há uma grande diferença entre ter indícios suficientes para promover uma acusação e ter certeza para proferir uma condenação. E, na dúvida, o juiz deve sempre absolver, como ilustrado no caso de Daniel Alves.