Daniel Alves: Justiça tardia e a importância da revisão judicial

Caso destaca a fragilidade de provas e a vitalidade do duplo grau de jurisdição para corrigir erros.

Gostaria de refletir sobre a beleza e a importância do duplo grau de jurisdição, um pilar do nosso sistema democrático que garante a todo acusado o direito constitucional de ter sua sentença revisada por uma instância superior. Essa análise se torna particularmente relevante no caso do jogador Daniel Alves. 

O cuidado que devemos ter com a reputação alheia - Foto: Goh Rhy Yan na Unsplash

Inicialmente, Daniel Alves enfrentou uma acusação gravíssima de estupro, resultando em uma condenação superior a quatro anos. No entanto, após a revisão da sentença, ele foi absolvido devido à fragilidade das provas apresentadas pela acusação. A decisão ressalta um princípio fundamental do direito: na dúvida, o juiz deve sempre absolver. É preferível absolver um possível culpado do que condenar um inocente, especialmente quando o Ministério Público não consegue comprovar a materialidade do crime de forma inequívoca.

O caso Daniel Alves ilustra os perigos de uma condenação injusta. Ele foi, em um primeiro momento, publicamente execrado, sofrendo as consequências da tríplice responsabilidade penal: perda da reputação (tanto pública quanto familiar), privação da liberdade (com a prisão preventiva que durou meses) e prejuízo financeiro (devido à multa de mais de um milhão de euros e possíveis indenizações por danos morais).

 

Ricardo Pinheiro

A aplicação da tríplice responsabilidade penal se encaixa perfeitamente no caso de Daniel Alves, um indivíduo que, mesmo sendo inocente, foi submetido a um linchamento público. Felizmente, ao ter seu caso revisado sob a égide do duplo grau de jurisdição, o Tribunal espanhol, composto por três desembargadoras e um desembargador, o absolveu por unanimidade, reconhecendo a falta de confiabilidade e a fragilidade das provas apresentadas pela acusação.

Essa decisão unânime, que absolveu Daniel Alves de uma acusação de estupro (um dos crimes mais graves e repugnantes do nosso sistema penal), nos leva a uma profunda reflexão sobre a condução inicial do processo. A denúncia fragilizada, somada à espetacularização midiática, destruiu a reputação de Daniel Alves. Agora, pergunto: como fica a reputação de Daniel Alves? Será que o Estado irá compensá-lo pelos danos causados? A exposição midiática do caso trará algum benefício para ele?

É imperativo questionar se a pessoa que fez a acusação infundada contra Daniel Alves (e quem afirma isso é o próprio tribunal) responderá por denunciação caluniosa, por ter dado causa à instauração de um processo criminal contra um inocente. O caso Daniel Alves é um exemplo marcante de como a vida de uma pessoa pode ser destruída por acusações precipitadas e como o duplo grau de jurisdição é essencial para corrigir injustiças.

Quem irá ressarcir Daniel Alves pelos meses de prisão preventiva e pelos gastos com advogados e fianças? Este caso paradigmático demonstra a importância do duplo grau de jurisdição na análise da coerência das decisões judiciais. Que o caso Daniel Alves sirva de alerta para aqueles que duvidam da nossa justiça: ela pode tardar, mas não deve falhar.

Devemos refletir sobre o impacto devastador de acusações infundadas e do sensacionalismo midiático na vida de um indivíduo. Será que a acusação, mesmo diante da fragilidade das provas, tem o direito de acusar sem qualquer responsabilidade? Não seria o momento de repensarmos a forma como as denúncias são apresentadas? Há uma grande diferença entre ter indícios suficientes para promover uma acusação e ter certeza para proferir uma condenação. E, na dúvida, o juiz deve sempre absolver, como ilustrado no caso de Daniel Alves.