O Ministério Público Eleitoral do Piauí instaurou uma Ação de Investigação Judicial Eleitoral contra o suplente de deputado estadual Marcus Vinicius Kalume, candidato ao cargo de prefeito de Floriano e Daguia de Dona Bela, candidata a vice-prefeita pela Coligação "Floriano é do amor e da esperança".
Na ação, o promotor eleitoral Edgar dos Santos Bandeira Filho pede que seja reconhecido o abuso de poder político-econômico e que Marcus Vinícius e Daguia de Dona Bela sejam condenados à cassação do registro ou diploma e à inelegibilidade pelo prazo de oito anos.
Para o Ministério Público Eleitoral, há fortes indícios de abuso de poder político-econômico e uma série de irregularidades no contrato que trouxe, em 9 de setembro, o padre Fábio de Melo a Floriano. A promotoria acredita que Marcus Vinicius se utilizou politicamente do evento para promover sua pré-candidatura.
Abuso de poder político-econômico
O evento, que teve patrocínio do Governo do Estado do Piauí, através da Coordenação de Enfrentamento às Drogas, não houve um único ato de divulgação do show. Isso levantou sérias suspeitas do MP. Por outro lado, o então pré-candidato ao cargo de prefeito de Floriano, Marcus Vinícius Malheiros Kalume, anunciou o show um mês antes de acontecer e propagandeou o show antes, durante e depois do evento, sem sequer citar o Estado do Piauí ou a Coordenadoria Estadual que seria responsável pelo evento, ou seja, criando deliberadamente a impressão em qualquer um que tivesse acesso a estes atos de divulgação que ele, Marcus Vinícius, era o responsável pela realização do show.
Contrato suspeito
Em uma consulta ao mural dos contratos do TCE-PI não se encontrou contrato para realização de show do padre Fábio de Melo em Floriano, seja pesquisando-se o nome do artista ou de seu empresário (FAROL MUSICAL PRODUTORA LTDA). Diante disso, se requisitou a Superintendência de Licitações e Contratos do Estado do Piauí cópia dos processos de contratação do show, mas o órgão negou ter realizado contratação similar.
Só que no mural dos contratos do TCE-PI, o MP-PI localizou o Contrato n° 202/2024 – CENDFOL, cujo objeto é “o patrocínio prestado pelo Estado do Piauí, através da COORDENADORIA DE ENFRENTAMENTO ÀS DROGAS E FOMENTO AO LAZER (CENDFOL/PI), e à empresa TOTAL COMERCIO E SERVIÇOS LTDA, para a promoção do seguinte evento: NOME DO EVENTO: “FLORIANO DE DEUS” LOCAL E CIDADE: FLORIANO /PI DATA: 16 DE AGOSTO DE 2024”.
"Há no contrato e na forma de contratação uma série de irregularidades e estranhezas. Mas, a primeira constatação foi de que o show investigado realmente foi patrocinado pelo Estado do Piauí. O estado dá patrocínio para uma pessoa jurídica privada e esta, por sua vez, também não contrata diretamente o show, quem assina o contrato é outra pessoa jurídica situada em Ananindeua-PA. Tudo a deixar bastante evidente uma tentativa do estado do Piauí ou de suas autoridades de tentar se desvincular do evento, cedendo os recursos para a sua realização, mas através de interpostas pessoas jurídicas", cita o órgão.
Foram realizadas várias “voltas” para realizar a contratação do show que demonstram "interesse em ocultar a participação do estado". Outro fato é que o contrato é de patrocínio para realizar o evento “Floriano de Deus”, mas em nenhuma parte do contrato consta o que seria esse evento, em que ele consistiria, ou seja, quais produtos ou serviços estavam sendo patrocinados.
Suspeita de superfaturamento
O MP afirma que o contrato com o Padre Fábio de Melo foi cotado com o valor do cachê de R$ 180.000,00 (cento e oitenta mil reais). Neste mesmo contrato, ficou previsto também que a estrutura do show (palco, som, iluminação, camarins, etc), transporte, hospedagem e alimentação do artista e seu staff, seriam por conta do contratante.
Portanto, o valor do patrocínio de R$ 400.000 (quatrocentos mil reais) fornecido pelo estado do Piauí seria suficiente apenas para a realização do show. Por isso, o Ministério Público questiona: por que o contrato não especificou que o patrocínio era simplesmente para a realização do mencionado show?
"Trata-se de mais um indício de que o estado do Piauí ou suas autoridades tentaram disfarçar conexão com o evento. Além de tudo, no contrato consta que o evento seria realizado em 16 de agosto, mesma data em que foi assinado o contrato. Isto, por si só, já é bastante suspeito. Até porque o evento foi realizado em 09 de agosto, certamente já com os recursos do estado do Piauí, que, apenas posteriormente, formalizou o contrato de patrocínio".
Para o Ministério Público Eleitoral, esse show aconteceu com a única finalidade de promover a imagem do então pré-candidato a prefeito de Floriano Marcus Vinícius Malheiros Kalume, única figura pública que realizou divulgação do show e sempre em seu próprio nome, visando, nesse contexto, obter benefícios eleitorais.
"Houve, também, o uso exorbitante de recursos patrimoniais públicos, no montante de R$ 400.000 (quatrocentos mil reais), capazes de comprometer a isonomia da disputa eleitoral e a legitimidade do pleito, já que destinados ao benefício de uma determinada candidatura", disse o promotor.
Showmícios
A prática remonta aos showmícios, mistura de show musical com comícios políticos, em boa hora vedados pela legislação eleitoral (Art. 39, §7° da Lei n° 9.504/1997), que proibiu não só os showmícios, mas também eventos assemelhados a eles.
"O pré-candidato se aproveitou de um show bastante popular ao qual atrelou sua imagem e fez parecer ao público que era responsável pelo evento. Tudo isso há poucos dias do início da campanha eleitoral e para um público que já o via com o pré-candidato", cita a peça.
"O estado pode patrocinar o acontecimento de um show, mas não é normal que esse patrocínio se dê de forma escondida ou que o show em questão seja um evento sem nenhum nexo com o calendário de festividades e de eventos do município ou do estado, bem como não pode ser considerado coincidência o fato de este show ocorrer há poucos dias do início da campanha eleitoral. Trata-se então de um uso de recursos públicos direcionado a uma finalidade que não é o interesse público, mas sim o interesse eleitoral do pré-candidato que publicamente assumiu a responsabilidade pelo show".
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