Enquanto o setor nacional alerta para a presença de facções criminosas em quase mil postos de combustíveis no Brasil, o silêncio no Piauí chama atenção por outro motivo: a concentração do mercado nas mãos de grupos de fora, especialmente de São Paulo, sem transparência nem debate público.
A denúncia feita pela Federação Nacional do Comércio de Combustíveis (Fecombustíveis) aponta que ao menos 941 postos já estariam sob domínio direto ou indireto de facções criminosas. O alerta é nacional, mas os reflexos locais são inevitáveis. Lavagem de dinheiro, sonegação, guerra de preços, monopólio informal e relações promíscuas com a política o setor virou um ponto cego estratégico.
No Piauí, uma reconfiguração silenciosa acontece há anos
Postos tradicionais mudam de nome, donos saem de cena, redes são compradas, contratos são engavetados. Muitos desses negócios envolvem grupos empresariais do Sudeste, com sede em São Paulo, que chegam comprando tudo: terrenos, estoques, bandeiras e silêncio.
Nada disso é ilegal, mas tudo isso precisa ser olhado de perto.
Quem são os novos donos da gasolina no Piauí?
Por que o Ministério Público e os órgãos de controle ainda não se pronunciaram sobre a nova geopolítica dos combustíveis no estado? E por que o preço nas bombas parece obedecer a uma lógica que só interessa a poucos?
Não é acusação. É constatação. O setor de combustíveis é historicamente vulnerável ao controle de estruturas paralelas. E no Piauí, os sinais estão por toda parte. Falta só querer enxergar
Uma venda recente que diz muito sobre o silêncio do setor
Recentemente, uma das redes de postos mais conhecidas do Piauí foi vendida por um valor milionário. A transação ocorreu de forma veloz, quase invisível, e chamou atenção nos bastidores não pelo anúncio (que nunca veio) mas pelo impacto silencioso que gerou no mercado.
A operação envolveu um grupo empresarial de fora do estado, com sede em São Paulo, que assumiu o controle de dezenas de unidades. O mais curioso: muitos dos postos continuam operando com a mesma marca, como se nada tivesse mudado. Mas basta verificar os dados fiscais e comerciais para notar que os caminhos agora levam a outros centros de decisão.
Antes da venda, boatos circularam sobre o uso da estrutura da rede para movimentações políticas em campanhas eleitorais. Não houve investigação, nem explicação apenas o desaparecimento da antiga gestão e a entrada discreta de novos donos.
Esse caso, tão recente quanto sintomático, ajuda a entender o quanto o setor de combustíveis no Piauí permanece blindado por uma lógica que combina poder, conveniência e opacidade. Ninguém diz nada. E quem deveria fiscalizar, muitas vezes, sequer enxerga.
O Ponto de Ruptura
O setor de combustíveis é uma das maiores caixas-pretas da economia nacional. E talvez nenhuma outra área combine tão bem três elementos perigosos: muito dinheiro, pouca transparência e nenhuma fiscalização contundente.
No Piauí, onde a estrutura econômica é mais frágil e a política mais suscetível a influências externas, o controle desse setor se tornou uma moeda de poder. Quando um posto é vendido, quase ninguém nota. Mas quando todos os postos mudam de mãos, alguém está comprando mais que galões: estão comprando o direito de mandar sem ser visto.
A cadeia dos combustíveis no Brasil se tornou um terreno fértil para o crime organizado porque une três ingredientes que, juntos, são explosivos: alto giro de caixa, baixa rastreabilidade e enorme influência política. Quando um posto é comprado por um fundo paulista ou por um grupo de fachada, ninguém pergunta muito. E quando o litro do combustível sobe sem lógica, o consumidor só reclama mas não investiga.
Talvez seja hora de colocar mais do que gasolina no debate e perguntar: a quem interessa esse silêncio?