Nos últimos anos, tem crescido o número de figuras públicas brasileiras que deixaram o país alegando perseguição por parte do Supremo Tribunal Federal (STF). Majoritariamente ligadas ao campo da direita política, essas personalidades incluem jornalistas, influenciadores digitais, políticos e ativistas que afirmam ser vítimas de um processo de criminalização de opiniões e de repressão institucional. Elas têm buscado abrigo em países estrangeiros, onde continuam a divulgar suas ideias e a se posicionar contra decisões do Judiciário brasileiro.
A narrativa comum entre esses exilados é a de que o Brasil estaria vivendo sob uma “ditadura do STF”, onde a liberdade de expressão e o contraditório estariam sendo minados por decisões judiciais severas e, segundo eles, politicamente motivadas. Muitos desses indivíduos alegam que sua saída do país se deu por razões de segurança jurídica e pessoal, enquanto outros enfrentam processos legais ativos e até mandados de prisão. Apesar das acusações que enfrentam, mantêm presença ativa nas redes sociais e continuam engajados na política nacional à distância.
Este fenômeno de “exílio político” tem gerado debates intensos tanto no meio jurídico quanto na opinião pública. Enquanto apoiadores veem esses indivíduos como mártires da liberdade de expressão, críticos os apontam como responsáveis por discursos antidemocráticos e desinformação. A seguir, listamos os principais casos, as alegações feitas pelos “exilados”, e como cada um construiu sua narrativa de perseguição no exterior, além de examinar os desdobramentos legais e diplomáticos envolvidos.
Carla Zambelli: condenada e em exílio Europeu
Última a deixar o Brasil, a deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) foi condenada pelo STF a 10 anos e 8 meses de prisão por invasão ao sistema do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e porte ilegal de arma. Pouco depois da condenação, deixou o Brasil rumo à Europa. Zambelli alega que está sendo perseguida por suas posições políticas e que sua atuação parlamentar foi criminalizada. Em pronunciamentos públicos, tem afirmado que vai denunciar em organismos internacionais o que considera um cerceamento de liberdades no Brasil.
Zambelli tem usado suas redes sociais e canais de comunicação para manter contato com apoiadores e reforçar sua narrativa de que é vítima de um sistema judicial parcial. Em seus discursos, defende que o STF estaria atuando com motivação ideológica e fora dos limites constitucionais. Ela também afirma que sua condenação não possui embasamento jurídico sólido, sendo resultado de uma perseguição sistemática contra figuras conservadoras.
No exterior, a deputada certamente tentará construir alianças com movimentos políticos e organizações internacionais, na tentativa de internacionalizar sua causa. Ela tem participado de eventos e concedido entrevistas em que denuncia o sistema judiciário brasileiro, colocando-se como símbolo de resistência a um suposto autoritarismo do Judiciário. Seu exílio é apresentado por ela como um sacrifício necessário para manter a coerência com seus princípios.
Allan dos Santos: jornalista refugiado nos EUA
Fundador do canal Terça Livre, Allan dos Santos é um dos casos mais antigos desta onda de exílio. Está nos Estados Unidos desde 2020 e é alvo de investigações por disseminação de fake news e incitação contra as instituições democráticas. Alega que as ações judiciais contra ele têm motivação política e que o STF ultrapassa seus limites constitucionais. O governo brasileiro solicitou sua extradição, mas as autoridades americanas recusaram, apontando que se trata de um caso de opinião protegida pela liberdade de expressão.
Allan dos Santos frequentemente critica o sistema judiciário brasileiro em seus canais digitais, acusando os ministros do STF de extrapolarem suas funções e perseguirem opositores ideológicos. Para ele, o Judiciário tem sido utilizado como instrumento político para silenciar vozes conservadoras. Ele se apresenta como defensor da liberdade de expressão e denuncia o que considera uma censura institucionalizada no Brasil.
Apesar das dificuldades, Allan mantém presença constante nas redes sociais e em eventos voltados à direita política internacional. Ele busca apoio de organizações que promovem a liberdade de imprensa e os direitos civis, com o objetivo de fortalecer sua imagem como vítima de perseguição judicial. Seus seguidores veem sua permanência nos EUA como uma resistência ao que descrevem como autoritarismo judiciário no Brasil.
Paulo Figueiredo: neto de ex-presidente, sob acusação de golpe
Radicado nos Estados Unidos, Paulo Figueiredo é neto do ex-presidente João Figueiredo e está entre os investigados por tentativa de golpe de Estado. Acusado de envolvimento com os atos de 8 de janeiro de 2023, teve seu passaporte cancelado pelo STF. Não apresentou defesa formal no processo. Em suas redes sociais e entrevistas, afirma que não há provas concretas contra ele e que sua postura crítica ao STF resultou em perseguição judicial.
Paulo tem se manifestado com frequência sobre o que considera ser uma escalada autoritária no Brasil. Ele argumenta que a operação judicial contra figuras conservadoras é seletiva e politicamente motivada. Segundo ele, seu envolvimento com os protestos de 2023 se limitou à cobertura jornalística e à manifestação de opiniões legítimas, e não a qualquer ação ilegal.
Além de se defender das acusações, Figueiredo tenta posicionar-se como representante de uma nova direita internacional. Participa de debates e fóruns com lideranças conservadoras globais, apresentando o caso brasileiro como exemplo de perseguição política disfarçada de legalidade. Seu nome é citado frequentemente em transmissões e veículos da direita nos EUA.
Eduardo Bolsonaro: deputado em licença e ativismo internacional
Eduardo Bolsonaro, deputado federal e filho do ex-presidente Jair Bolsonaro, encontra-se em licença do mandato e fora do país. Alega que o Brasil enfrenta uma "ditadura do Judiciário" e tem buscado apoio junto a parlamentares e entidades internacionais para denunciar o que considera uma erosão das garantias democráticas. Ele tem se apresentado em eventos nos Estados Unidos como defensor da liberdade de expressão e opositor ao que descreve como "ativismo judicial do STF".
O parlamentar tem se aproximado de figuras políticas norte-americanas e europeias, com o intuito de internacionalizar suas denúncias. Em suas falas, Eduardo frequentemente compara o cenário político brasileiro a regimes autoritários, destacando o que considera excessos do Judiciário e a falta de equilíbrio entre os Poderes. Também tem utilizado seu perfil público para apoiar outros brasileiros em situação semelhante.
Sua permanência no exterior também é usada estrategicamente para manter ativa sua base de apoio político, mesmo à distância. Eduardo tem lançado conteúdos nas redes sociais e realizado encontros com simpatizantes para discutir estratégias de resistência ao que define como censura e perseguição institucional no Brasil. Ele reforça a ideia de que seu afastamento é uma forma de autoproteção contra um sistema que considera hostil à oposição.
Rodrigo Constantino: analista político e crítico exilado
Rodrigo Constantino, comentarista político conhecido por suas opiniões conservadoras, também reside nos Estados Unidos. Seu passaporte foi cancelado pelo STF, e ele é citado em inquéritos que apuram discursos antidemocráticos. Constantino afirma que está sendo punido por manifestar opiniões e que o Brasil atravessa uma fase de censura institucionalizada. Participa ativamente de debates e produção de conteúdo que visam questionar a legitimidade das ações do Judiciário brasileiro.
Ele argumenta que está sendo criminalizado por exercer seu direito constitucional à liberdade de expressão. Em artigos e participações na mídia, denuncia o que chama de instrumentalização do STF para reprimir vozes dissonantes. Segundo Constantino, os inquéritos em curso ignoram garantias legais básicas e têm por objetivo intimidar críticos do sistema judicial.
Atualmente, Rodrigo mantém colunas em veículos digitais e produz vídeos comentando o cenário político brasileiro. Em suas intervenções, enfatiza que o Brasil enfrenta uma crise institucional sem precedentes, onde o Judiciário teria assumido funções típicas do Legislativo e do Executivo. Para ele, seu exílio é uma forma de proteger sua integridade física e jurídica.
Oswaldo Eustáquio: asilado na Espanha
O jornalista Oswaldo Eustáquio está na Espanha, onde teve seu pedido de asilo político aceito. Investigações no Brasil o apontam como um dos articuladores dos ataques de 8 de janeiro. Ele nega envolvimento direto e diz que é perseguido por suas reportagens e investigações sobre figuras do Judiciário. A Justiça espanhola negou a extradição, entendendo que as acusações contra ele têm natureza política.
Eustáquio se define como jornalista investigativo e diz que suas reportagens revelaram práticas abusivas de integrantes do sistema de Justiça brasileiro. Em seus canais, frequentemente afirma que a perseguição contra ele se intensificou após a publicação de conteúdos comprometedores. Ele acusa ministros do STF de atuarem como censores de conteúdo jornalístico.
No exílio, Eustáquio segue ativo em redes sociais e mídias alternativas. Participa de lives, podcasts e eventos em que discute sua situação e o que chama de autoritarismo judicial. Seu caso tem sido usado como bandeira por movimentos de direita que denunciam uma suposta perseguição sistemática a jornalistas e comunicadores conservadores.
Monark: influencer e crítico do STF
Bruno Aiub, conhecido como Monark, influenciador digital e ex-apresentador do Flow Podcast, deixou o Brasil após condenação por injúria contra um ministro do STF. Ele afirma que vive um exílio involuntário e que não se sente seguro para retornar ao país. Segundo Monark, suas declarações foram interpretadas fora de contexto e criminalizadas. Hoje, continua a produzir conteúdo em suas redes, denunciando o que chama de censura judicial.
Monark alega que está sendo vítima de uma perseguição desproporcional e que o Judiciário brasileiro está ultrapassando os limites da legalidade. Em seus vídeos e postagens, defende que a liberdade de expressão está sendo sufocada e que figuras públicas estão sendo usadas como exemplo para intimidar outros críticos. Para ele, o STF assumiu uma postura punitiva e política.
Mesmo fora do país, Monark mantém grande audiência e influência, principalmente entre o público jovem. Ele utiliza sua visibilidade para fomentar debates sobre os limites da liberdade de expressão, o papel das instituições e os riscos do que chama de censura oficial. Sua narrativa reforça a ideia de que o Brasil está passando por uma crise democrática que exige vigilância internacional.
Acusados pelos atos de 8 de Janeiro: fuga e exílio
Além das figuras públicas já amplamente conhecidas, há dezenas de investigados e réus no inquérito do STF sobre os ataques de 8 de janeiro de 2023 que fugiram do Brasil após a intensificação das investigações. Muitos deles buscaram refúgio em países como Estados Unidos, Paraguai, Argentina, Portugal e México, alegando temer perseguições e penas desproporcionais.
Entre os nomes que se destacam estão influenciadores digitais, empresários e ativistas que tiveram mandados de prisão expedidos ou que foram citados em delações premiadas. Alguns requisitaram asilo político, outros aguardam decisões judiciais sobre extradição. Boa parte continua a se comunicar com o público brasileiro pelas redes sociais, onde insistem na tese de que o Brasil vive sob censura e autoritarismo judicial.
Estes exilados de menor visibilidade vêm alimentando a narrativa de que são vítimas de um processo de vingança institucional. Seus perfis variam, mas a maioria compartilha o discurso de descrédito ao STF e ao sistema eleitoral. As autoridades brasileiras continuam monitorando e acionando a Interpol na tentativa de trazê-los de volta para responder na Justiça. O número exato de foragidos permanece em constante atualização.
Fuga / Exílio / Asilo
Para melhor compreender a situação dos personagens citados anteriormente, é fundamental distinguir juridicamente três categorias distintas frequentemente confundidas no debate público: fugitivos, exilados e asilados. Os fugitivos são aqueles que deixam o país ou escondem-se para evitar responder judicialmente por crimes imputados, geralmente com mandado de prisão expedido ou inquérito em curso. Legalmente, sua saída é interpretada como tentativa de obstrução da Justiça, e suas ações são tratadas com rigor pelo sistema legal.
Já os exilados são, tradicionalmente, pessoas que deixam seu país por divergências políticas profundas com o regime vigente, geralmente em contextos autoritários ou de guerra. No Brasil atual, o termo tem sido usado por alguns investigados para qualificar sua própria condição, mas essa autodeclaração não tem respaldo legal específico, sendo mais uma construção narrativa do que uma definição jurídica formal.
Por fim, os asilados são aqueles que, mediante solicitação formal, obtêm reconhecimento de outro país como perseguidos políticos, o que impede sua extradição. O asilo político é uma figura prevista no direito internacional e envolve um processo de análise criteriosa por parte do país acolhedor. Casos como o de Oswaldo Eustáquio, por exemplo, ilustram essa condição, já que a Justiça espanhola reconheceu o viés político das acusações contra ele.
Compreender essas distinções é essencial para avaliar as alegações de perseguição e os desdobramentos internacionais desses casos. A complexidade jurídica e política envolvida exige uma análise cuidadosa dos fatos, dos processos judiciais e das narrativas construídas por cada envolvido. Em um contexto de polarização, é preciso separar argumentos jurídicos de discursos retóricos para garantir um debate público informado e equilibrado.